Resenha: Black Paradox

Quando um quadrinho vem descrito como uma série de histórias de temática similar você não duvida que seja uma coletânea, mesmo que os personagens se repitam, ainda mais quando Junji Ito é o nome por trás da obra. Nada impede também que apenas a estética seja similar ou que o principal morra e reviva em cada conto.

Então, imaginem minha surpresa ao descobrir que Black Paradox é sequencial? Ok, ignorem essa pergunta. Não tem como você se surpreender da mesma maneira que eu sem realmente ler, pois inicialmente acredito que nem o autor sabia que rumo o mangá iria tomar.

O primeiro capítulo é curto, fechado e tem personagens, tema e construção similar ao segundo, ao menos até certo ponto. Quatro pessoas se reúnem para cometer suicídio por meio de um misterioso site, o qual poderia ser o ponto de ligação entre contos, mas ocorre algo sobrenatural que impede a tentativa e leva para uma segunda, o capítulo seguinte, a qual novamente se interrompe por um motivo inusitado.

A diferença do segundo para o primeiro é a morte de um personagem e descobrimento de um mineral. O primeiro poderia significar que os personagens restantes morreriam, mas não por suicídio, e sim por meios grotescos ao tentarem se livrar da própria vida. Enquanto a pedra serviria apenas como um objeto estranho e fonte de medo.

Porem os capítulos restantes recebem uma maior atenção e o número de páginas engrossa, tornando a obra extremamente não linear e dando a impressão de que tudo foi construído a medida em que o autor progredia. Por fim culminando num enredo que gira em torno do mineral, assim enquadrando os dois primeiros capítulos como introdutórios aos personagens, mundo e motivo.

Sendo assim, Black Paradox se transforma subitamente de uma coletânea de contos sobre suicídio para um suspense com pitadas de horror e sci-fi, focando no desconhecido, e explorando a insanidade, ganancia, o narcisismo e o pós-morte, sem jamais perder o ritmo.

Apesar da trama parecer levar a lugar algum você segue devido a curiosidade, querendo descobrir que estranhezas estarão por vir e qual vai ser o final de cada um dos membros do grupo, além de querer entender melhor o papel do mineral e ver se no fim as pontas se juntam.

Basicamente, você se torna teimoso. Tudo indica um desfecho ruim, pois temos um começo estranho, número inusitado de páginas, poucos capítulos e um avanço até certo ponto rápido. E mesmo assim a leitura não para. Talvez devido a brilhante narrativa do autor, ou quem sabe por conta de um raciocínio falho que enquadra a obra como um passatempo rápido, indolor. Afinal, que mal faz ler algo vez ou outra apenas para dizer que leu?

Sei que é estranho afirmar isso numa resenha, mas tem um motivo. Acredite quando digo que você passara por isso, ou passaria se lesse as cegas, e que isso faz parte da experiência. Pois repito, tudo indica algo falho, e ainda assim Black Paradox termina de maneira perfeita, aqui não sugerindo algo nota 10, mas sim um título que fecha sem problemas.

Ao invés de dar corda e buscar uma publicação longa, algo que talvez nem fosse possível mas que insinuamos que daria, o mangá termina sem realmente acabar, dando uma previsão dos acontecimentos futuros, mas sem realmente parecer algo forçado, pelo contrário. Uma decisão sabia que leva o leitor a pensar e filosofar junto do apresentado.

Black Paradox do início ao fim é um conto de suicídio, pois o ato de tirar a própria vida é pensar em si próprio e ceder aos próprios desejos, ignorando a tudo e a todos no processo, e ao decorrer da obra vemos diversas situações que descrevem perfeitamente isso, mesmo que a morte não seja claramente ligada a ela. Um ciclo sem fim de enredo ampliado que nos leva a questões importantes, sem deixar de lado o clima característico do autor.

No fim esse é um quadrinho difícil de recomendar e ainda mais de se explicar, como puderam ver. Porem uma coisa é certa. Ele fisga o leitor, entretém, e apesar de possuir cenas grotescas elas são bem espaçadas e o enredo não gira em torno apenas do “monstro da vez”. Um bom início para qualquer um que queira encarar o mestre Junji Ito.

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Texto publicado originalmente em 24/02/2017

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